A Europa, não raras vezes apelidada de
“Velho Continente”, é, por definição, diversa, seja a nível étnico-linguístico,
seja em termos culturais, sociais e históricos, e ainda nas diferenças a nível
político e no modelo económico, embora algumas as diferenças tenham a tendência
para se esbater, existe ainda uma enorme dicotomia Norte-Sul, sendo que no caso
do Sul, em que nos inserimos, muitas vezes se torna mais fácil criar afinidades
com pessoas da América do Sul ou mesmo de África, devido a certas semelhanças
socioculturais.
A Europa revela uma tendência para
reagir às crises com integração e porventura, alargamentos, verificamos que
mesmo num período conturbado em que se questiona a existência da União a
curto-médio prazo, a Croácia irá juntar-se à União a partir do dia 1 de Julho
de 2013, a meu ver, é um indicativo de que uma desagregação não está nos planos
da Europa, ou, sendo mais conciso, do principal país decisor, a Alemanha, que
se mantém à tona de todo o caos em voga um pouco por todo o continente mas mais
concretamente no Sul, exibindo ares de alguma “falsa inocência”, a própria
União tem responsabilidades na crise atualmente vivida, sem descurar obviamente
os erros de cada país e a corrupção sistemática nos mesmos, pois torna-se fácil
recordar a Política Agrícola Comum, PAC, e a política das pescas, em que países
como Portugal foram “subsidiados” para reduzir a sua produção a níveis
baixíssimos, o que obviamente leva a um decréscimo na produtividade, a
aplicação de modelos uniformes a países com inúmeras diferenças a todos os
níveis, mas neste caso concreto, económicas, torna-se ruinosa.
Pegando no período entre 1989 e 1991,
fértil em revoluções políticas, o colapso de URSS e a queda do muro de Berlim,
no meio de toda esta incerteza a Comunidade Europeia avançou para um processo
de integração e assinou ainda o tratado de Maastricht, maior integração poderá
significar maior interdependência, porém, o grau de dependência difere
drasticamente consoante os estados-membros. A ideia muitas vezes preconizada de
“prosperidade comum” torna-se bastante questionável quando existe no seio da
União um cariz de decisões no limiar do totalitário, novamente com a Alemanha a
assumir o seu leme, os interesses da União parece não raras vezes
indissociáveis dos interesses alemães.
Os autores do documento elogiam o cariz
democrático da União e a sua “causa”, exaltando a união de países que tinham
acabado de sair de uma guerra mundial, não só aqui mas noutros aspetos é
possível estabelecer-se uma comparação com a URSS, podemos destacar também a
nacionalidade “europeísta”, basicamente promover o esquecimento de tradições, costumes
e nacionalidades, o que é, no fundo, o que Bruxelas mostra tenções de fazer, a
expansão é outro fator comum, a URSS expandiu-se para continuar a existir, a
União parece querer fazer o mesmo. A “democracia” de fachada parece me também
outro dos paralelismos, a URSS possuía também uma espécie de parlamento, o
soviete supremo, onde eram aprovadas sem grande cerimónia todas as decisões,
quando comparado com o Parlamento Europeu, torna-se difícil vislumbrar alguma
tomada de decisão muito significativa, isto leva-nos a um outro tipo de “gulag”, o que promove o “politicamente
correto”, um processo de diluir opiniões até que se forme um “populismo
saudável” com base num conceito vazio e questionável como a “moderação”,
qualquer opinião fora deste espectro deve ser silenciada.
A mesma “liberdade” idealizada no modelo
europeu encontra-se agora em sério risco, e adensa-se ainda mais esta ideia ao
contemplar planos de austeridade draconiana impostos externamente, que não só
ameaçam a soberania de cada país como a atropelam, da mesma maneira que
declarações como a da Chanceler alemã, Angela Merkel, que referiu que os países
devem ser “Obrigados a cumprir” os programas, e mais recentemente, que deveriam
“abdicar da sua soberania”, indago-me de que soberania estará a líder de facto da União a referir, dada a
escassez da mesma, ou mesmo as declarações mais antigas de dois políticos
alemães, importantes membros do político CDU, de Merkel, que sugeriu que a
Grécia deveria “vender ilhas para evitar a bancarrota, ou mesmo a Acrópole e o
Pártenon”. Quando declarações desta estirpe são apenas repudiadas pelo povo
grego, e não do seu governo, ou do governo de qualquer outro estado membro,
penso que é o momento ideal para finalmente retirar a máscara dos valores da
“democracia”.
A referência feita a valores perdidos e
a defeitos que ressurgem, feita pelos autores, tem tanto de prosaico como de
romântico, sendo certo que existem concretamente valores positivos e negativos,
o correto e o errado, torna-se bizarro e hipócrita deificar a Grécia clássica,
Roma, na forma do Império Romano, e Jerusalém, sendo que podemos atribuir a
cada uma delas, respetivamente, mas não só, a escravatura, o imperialismo, e a
expropriação, perseguição e isolamento de uma nação e de um povo, sob a égide
de valores ocidentais como a “moderação” e o “politicamente correto”,
apresentando-se a tese sem propor a antítese, a síntese, sua superação, é
inexistente, isto na dialética hegeliana.
Os autores defendem ferreamente a união
política, segundo eles, uma moeda comum só será viável se a federação for uma
realidade, citam os tratados europeus como uma dos fatores que levam á
obrigatoriedade de uma união política, em que não haveria um “abandono de
competências dos estados nacionais”, tendo em conta que cada vez existem menos
competências exclusivas aos estados e mais diretrizes e imposições legais da
EU, torna-se difícil vislumbrar uma união política em que existam sequer
competências exclusivas a cada estado que sejam relevantes, e aqui se
estabelece outro ponto em comum com a URSS, a coação, num caso através da ocupação
militar, no outro, por constrangimentos económicos e terrorismo financeiro.
Outro dos argumentos a favor da
integração é o de que a Europa se desmoronaria numa difusão de “precariedade,
desemprego, regressão social, miséria”, pergunto me em que iria diferir em
países como Portugal e Grécia, em que todos estes fatores parecem já algo
implícito, destaque-se a opinião de que “já não existe outra opção: ou a união
política ou a morte”, uma sentença proferida sem qualquer argumento
substancial, que não a repetição incessante de slogans de “solidificação”, “integração”, “cooperação”,
“solidariedade”, no fundo, palavras opacas, quando não estão presentes medidas
concretas para as sustentar.
Concordarei, no entanto, que o modelo europeu
atual falhou. Pode ser comparado a um doente em estado terminal a quem se
continua a administrar morfina, não deixa de ser no entanto redutor que apenas
se considere apenas uma via para o sucesso da Europa, sendo importante destacar
que o sucesso da Europa nem sempre significa o sucesso de todos os seus estados
membros, e mais importante, a que custo?
Não descurando as suas presumíveis e
legítimas boas intenções, verificamos a típica linha de pensamento dos intelectuais,
arrogando-se no direito de saber mais sobre os indivíduos do que eles próprios,
desconhecimento sobre o “mundo real” e os processos de mercado, deificação ou
crítica fácil, julgando-se moral e intelectualmente acima de tudo e de todos.
Por cada ditador da história, por cada
Hitler ou Estaline esteve sempre presente um conjunto de intelectuais que
legitimava a sua atuação do ponto de vista cultural, ideológico e filosófico.
As massas terão tendência para exaltar textos deste cariz como sendo verdades
absolutas e inquestionáveis, neste sentido, terminarei citando o escritor turco
Mehmet Murat Ildan :
“A frase “Sabedoria das massas” não está
presente na história, pois a sabedoria não é suficientemente abundante para
formar massas.”